domingo, 28 de diciembre de 2008

As mesmas velhas e conhecidas sensações

Belo Horizonte. De volta ao meu quarto, bagunçado e inundado por roupas, livros e discos que, invariável e indiscutivelmente, me remetem ao meu lar de outrora. Escuto Dylan e tomo cerveja. Algumas coisas nunca mudam.

* Não esqueci de contar minha passagem por Cusco e Machupicchu. Não esqueci, ainda...

Belo Horizonte
28/12/2008

jueves, 18 de diciembre de 2008

And in the end...

Cheguei em Buenos Aires nesta última segunda-feira. Estou me despedindo desta cidade que foi minha casa durante um ano e três meses e dos bons amigos que fiz. Agora é só comprar passagem (vou olhar isso agora!!) e voltar a subir Bahia e descer Floresta. Ainda tenho que contar algo sobre Cusco e Machupicchu, mas vai ficar pra depois.

Buenos Aires
18/12/08

miércoles, 10 de diciembre de 2008

Minha Copacabana querida...

Às três da tarde do já citado vinte e nove de novembro, deixei La Paz e segui para Copacabana, minha última estação em Bolívia. Como o horário real de saída nunca coincide com o escrito no bilhete, nos atrasamos em meia hora, ou pouco mais. Para chegar em Copacabana é preciso, mais ou menos na metade do caminho, cruzar ao outro lado do Titicaca em um pequeno bote. O ônibus segue em um adequado e seguro bote o mesmo trajeto. Nos acomodamos para ter o primeiro contato com o lago. Um garoto falante, que deve ter três anos, estava, ao meu lado, sentado no colo do pai. Olhou-me, apontou e disse com espanto, como se não pudesse crer no que acabara de ver: Jesus! "Deus me livre! Eu tenho medo, morrer dependurado numa cruz". Voltamos ao ônibus para seguir viagem. Tínhamos mais uma hora e meia de estrada. Chegamos em perfeitas condições em Copacabana e fui logo procurar uma hospedagem. Consegui um quarto com vista para o Titicaca, no último andar do hotel (sem pintura mesmo, fachada de alegres e tranquilos tijolos), andar esse com um belo terraço, onde a vista era ainda melhor. Tudo isso por dez pesos bolivianos. Baratíssimo. Me instalei com a tranquilidade de um sábio chinês e fui comer um peixe frito em um bar a menos de cem metros da margem do poderoso lago. Voltei para casa, fumei um cigarro no terraço e me recolhi no quarto para ler e escrever um pouco. Mas, deste pequeno e cômodo quarto, comecei a escutar música. Como, se o rádio que tenho na cabeça estava desligado? Obviamente, vinha da rua. Interessado e curioso, fui conferir o que se passava. Era uma banda, com uniforme e tudo, dessas antigas que você vê no interior, no campo, tocando músicas folclóricas e dançando. Na quase uma hora em que estive acompanhando a banda, não havia luz na pequena, tranquila e muito turística Copacabana. Melhor assim, pois a luz das estrelas, nessa noite, eram mais fortes e vivas que a luz de mil postes juntos. Teto de estrelas, cada uma com seu nome. Eu era parte de uma espécie de procissão religiosa que acompanhava a música andante, com as estrelas me protegendo naquela escuridão confortante. Fui tomado por cócegas na alma, que me fizeram rir e suspirar. Expressões de ternura e felicidade por poder estar ali. Voltei para o hotel e dormi com um sorriso na boca. Dia seguinte, domingo de sol em Copacabana. Acordei tarde, ao meio-dia, e fui ao Mercado almoçar. Mais do mesmo: sopa e segundo prato. Até um pequeno e astuto mico foi levado por sua família para o almoço. Satisfeito, saí a caminhar. Caminhando por três quartos de hora lado a lado com o Titicaca, afastei-me de todos e, quando estava sozinho com as aves e o lago, sentei-me em uma grande pedra. Estive toda a tarde tirando fotos, escrevendo e falando sozinho. No caminho de volta, um cachorro acompanhou-me em mais da metade do percurso. Não sei o seu nome, ele não quis dizer. Nunca havia conhecido um cachorro tão calado! Pelo menos não se incomodou em ser meu modelo em um par de fotos. Voltei ao Mercado para fazer uma necessária merenda. Depois de uma breve caminhada, eu já estava no terraço do hotel. À minha frente, o sol, displiscente, escondia-se por detrás das montanhas. O Titicaca completava meu quadro. Esse foi, seguramente, o entardecer mais laranja que eu vi com esses meus olhos de papel. Às minhas costas, montanhas de veludo. Deitei meu simples e ordinário corpo na cama para fumar um cigarro e ler. Gracias por presentarme a Arlt. E falar sozinho também. Mais tarde, fui ao Mercado comer minhas queridas refeições e voltei para casa. Naquela triste e generosa cama, comecei a pensar de forma nostálgica e melancólica até que me desse sono e meus olhos se fechassem sem que eu pudesse reagir com um mínino e inútil esforço bestial. Segunda-feira, primeiro dia do último mês deste dois mil e oito de inúmeros câmbios. Costumeiro almoço no Mercado para depois fazer o passeio pela Isla del Sol. Valeu a pena. Cheguei em Copacabana a tempo de ver, pela última vez, o sol se esconder preguiçosamente. Fui jantar (sim, lá mesmo) e voltei ao quarto, onde havia sonhado nas duas noites anteriores, para arrumar minhas tralhas e dormir cedo. No dia seguinte, às oito e meia, deixei minha querida Copacabana, cruzei a fronteira e fui para Cusco. A aventura ganhava ares de capítulos finais.
* Texto finalizado em Cusco - Perú
04/12/08

martes, 9 de diciembre de 2008

Na margem do lago Titicaca sentei e chorei

Sentado numa pedra da minha altura e bem gorda, tirando fotos tendo o lago Titicaca à minha frente, como um quadro que nem o pintor mais atrevido ousou pintar. Estou bem perto de onde a água, depois de muito percorrer, vem benzer com o último beijo essas pedras tão vivas como eu. Fecho os olhos. Escuto o lago cantar. Vejo um barco com três pessoas. Estão perto, posso ver seus rostos. Neste pequeno barco de madeira estão Seu Jair e Seu Milton. O terceiro é o outro Jair, meu cumpadre. Eles jogam cartas. Caixeta, creio. Seu Milton e Seu Jair usam chapéu. O cumpadre, sorrindo feito criança brincando de roda, tem posto uma camisa azul com cinco estrelas no peito. Estão tão lindos e felizes! Gritei e acenei; me devolveram o cumprimento. Não sei por quê cargas d`água, talvez por duvidar da realidade dos fatos, abri os olhos numa pressa olímpica, para que nada me escapasse à vista. Vi, lá no fundo, quase sumindo naquele azul cor de infinito paraíso, o pequeno barco com os três. E, chorando, nos acenamos pela última vez.

Copacabana - Bolívia
30/11/08

Minha Viola (Raul Varella Seixas)

Eu tenho uma viola
que canta assim
Minha dor ela consola
Quando eu saí do meu sertão
Não tinha nada de meu
A não ser esta viola
Que foi meu pai quem me deu
E pelo mundo eu vou andando
Subo monte, desço serra
Minha viola vou tocando
relembrando a minha terra
E quando a tarde vai morrendo
vou pegando minha viola
Se estou triste e sofrendo
ela é quem me consola
Cada nota é um gemido
Cada gemido é uma saudade
De saudade estou perdido
viola, nessa eterna "solidade"
De saudade estou perdido
viola, nessa eterna "solidade"
E nesse sertão dos meus amores
quando me ponho a tocar
Emudecem seus cantores
para nos ouvir cantar
Canta a minha alegria
canta para eu não chorar
Entrarei no céu contigo
quando minha hora chegar.

domingo, 7 de diciembre de 2008

Voltemos à casa, companheiro Bruno...

Ontem cheguei ao meu último destino desta viagem: Machupicchu. Hoje, domingo de sol tímido e vento frio aqui em Cusco, começo a procurar passagens para voltar à casa. Fico aqui mais uns dois dias e desço até Buenos Aires, onde ainda tenho minhas coisas e minha vida. Bom... depois escrevo, como prometido, algo sobre meus três dias em Copacabana e minha passagem por Cusco e Machupicchu.
Cusco - Perú
07/12/08

miércoles, 3 de diciembre de 2008

Deus existe e é boliviano ?

Cheguei em La Paz depois de nove horas e meia de viagem. Desta vez, em estrada asfaltada. No ônibus, ao meu lado, estava uma senhora muito espaçosa. Queria dormir como se estivesse em sua cama. Ah, isso me irritou bastante! Minha alma tremia de raiva toda vez que eu olhava de rabo-de-olho aquele pedaço de gente esparramado ao meu lado. Mas como sou um homem moderno e civilizado, eu ria. Ria e apertava minha testa, segurando-me para não dar-lhe uma leve cotovelada e perguntar, com sorriso com raios de simpatia, se ela não queria as duas poltronas. Para desfrutar de tanto espaço assim, deve ser solteira. Ou viúva. Cinco e meia: fui ao hostel que me indicaram. Lotado. Agora, como não me resta outra, estou na Praça Presidente Murillo, esperando o tempo passar. Seis policias estão próximos a mim. Dois jogam cartas. Um deles usa um gorro com o desenho de uma folha de Cannabis. (Mais tarde ele trocou por um boné com a sigla UTOP). Há muitos pombos, parece até a Plaza de Mayo. São seis e meia. Vou esperar uma hora mais e voltar ao hostel, porque sei que não está lotado. O camarada nao quis "aceitar" ninguém naquele horário. Por preguiça, pelo horário um pouco suspeito, sei lá... Está um pouco frio. Não tenho cigarros e estou com muita preguiça de ir comprar, mesmo porque deve estar tudo fechado. Sinto um leve incômodo nas minhas costas. Quero dormir. Que seja logo...
La Paz - Bolívia
26/11/08
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Dito e feito: voltei ao hostel e consegui um quarto com o preço que eu estava disposto a pagar. Gostei muito do lugar. Grande, com uns quarenta quartos. Parece um prédio, com um pátio central que se comunica com todas as partes e andares deste lugar. Conzinhei algo e, ali mesmo na cozinha, conversei com dois franceses que seriam meus companheiros de todas as horas nos meus dias em La Paz. Chloé, uma francesa com um sorriso espontâneo, aberto como o céu, e Simon, um camarada de humor leve e divertido. Neste mesmo dia, nos encontramos por acaso no centro e saímos a caminhar. La Paz é maior que eu imaginava. Uma bagunça danada! Se escuta tanta buzina que já se acostuma, já faz parte do ar. Você se lembra dos "perueiros" que certa época invadiram o centro de Belo Horizonte? Aqui está cheio deles e gritam o nome dos bairros da mesma forma que os de BH gritavam. Bem rápido, alguns arriscam um ritmo mais ousado, por vezes engraçado. Me acostumei com a grandeza de La Paz e gostei muito da cidade. No outro dia acordamos, caminhamos um pouco e fomos almoçar no Mercado Popular. Um belo prato com arroz, bife ou milanesa, salada, batata frita e banana frita. Tudo isso por sete pesos bolivianos. Bem barato, não ? (Queridos compatriotas, aproveitem que Bolívia é tão barato e o Real vale quase 2.80 aqui, e venham conhecer essa maravilha de país. Não acreditem naquela conversa pra doi dormir de que Deus é brasileiro e fez todas as maravilhas por nossas terras.) Estava gostoso, tanto que no outro dia repetimos a dose no almoço. Mas o melhor de tudo foi encontrar lugares onde podíamos jantar por inacreditáveis 3,50 pesos bolivianos. Uma sopa como entrada e, de segundo prato, arroz, uma carne à escolha, salada e batata frita. Perfeito! Éramos sempre os únicos turistas nesses restaurantes. Muito legal comer onde comem os que são daqui ou aqui vivem. Lugar de turista é muito chato! E caro. Os franceses, mesmo estando com euros, não têm frescura e até preferem comer nesse tipo de local. Eu também. Não pense você que eram lugares caindo aos pedaços. Então para almoçar íamos ao Mercado, e para jantar, escolhíamos um restaurante onde podíamos degustar deliciosas comidas por um preço quase inacreditável. Foi muito bom conhecer Chloé e Simon, me senti à vontade com eles, como se os conhecesse desde criança e tivéssemos intimidade para fazer piadas sem graça ou dizer coisas que não se diz à uma pessoa que se acaba de conhecer. Na última noite em La Paz, vinte e oito de novembro, aniversário de minha querida irmã Daniela, saímos para jogar sinuca perto de onde estávamos "parados". Um bar com dez mesas. Ao lado da nossa, uns doze amigos tomavam ron com coca-cola, mascavam coca e se divertiam como crianças. Jogar sinuca parece que era o de menos, o bom mesmo era sacanear o outro e esquecer dos problemas. Nós éramos os únicos "de fora"; Cholé, a única mulher. Nossos vizinhos de mesa nos ofereceram ron com coca-cola. Un poquito no más, gracias. Folha de coca também. Ah, muy amable, gracias. Tiramos foto juntos, nos deram boas vindas e votos de sucesso e boa viagem. Foram muito simpáticos, um até tinha os olhos rasos d'água quando veio falar comigo. Somos feios mas não somos maus, disse com ternura espantosa. Os bolivianos sofrem muito preconceito, são chamados de atrasados, de índios bobos, burros e mal-educados. Ó, Senhor, perdoai tanta ignorância! Eles não sabem o que falam! Jogamos uma hora de sinuca, entre gargalhadas pelas péssimas jogadas e lances engraçados. Depois fomos à uma festa em um local que já conhecíamos. Uma festa boliviana, com música boliviana, com gente boliviana. Um senhor que animava o baile gritou com seu poderoso microfone: Viva França! Viva Brasil! Alguém lhe disse que estávamos ali. Acho que foi José, um camarada que gostou muito de nós três. Dançamos, tomamos cerveja quente e nos divertimos o suficiente para estarmos cansados e felizes. Na manhã daquele vinte e nove de novembro, um sábado com um sol tímido, quase não querendo dar as caras, eu, Chloé e Simon fomos almoçar nos nossos queridos restaurantes. Satisfeitos, nos despedimos com fortes abraços e com promessa de nos vermos em Buenos Aires, já que vamos estar em terras portenhas na mesma semana.
Foi lindo ver as mulheres, com pele de barro marcada pelo sol e pela vida dura, levando suas crias enroladas em mantas nas costas. Vestidas como quem vai para uma Festa Junina, com chapéu e lindas tranças. Foi muito bom estar com toda esta gente. Comendo nos restaurantes populares, dançando, conversando ao pé do ouvido, mascando coca juntos. Que Bolívia é um país muito pobre, com condições precárias, não é novidade pra ninguém. Pedaços de carne expostos ao sol e aos mosquistos são vendidos nos mercados e na rua. Sucos com bolsa plástica e canudinho. Encontrar refrigerante ou água gelados é uma dificuldade homérica. Geladeira gasta muita energia. Mas quê importa? Bolívia é muito mais que isso. É muito mais do que a imagem estúpida que pintam deste país e de seu povo. É muito mais que esse esteriótipo imbecil... Eu convido você a conhecer esse país fantástico. Se você não gostar, procure um médico. Te quiero mucho, Bolivia...
La Paz - Bolívia
29/11/08
* Deixei La Paz e fui para Copacabana. Gostei demais, lugar lindo! Gosto mais da Copacabana boliviana do que da Princesinha do Mar, tão cantada pela bossa-nova e endeusada pelas novelas da Globo. E que os brasileiros chauvinistas não me joguem pedras... Depois escrevo algo sobre minha estada em Copacabana para os poucos, porém nobres, leitores deste espaço.

lunes, 1 de diciembre de 2008

Hasta luego, Argentina

Desci em Humahuaca, conversei com um senhor sobre música (eu disse que não gosto de Roberto Carlos e ele achou ruim, quis saber o motivo). Nos despedimos e peguei o ônibus que dizia La Quiaca, cidade que faz fronteira com Villazón, já no lado boliviano. Cheguei à noite, não me lembro exatamente o horário, mas se tivesse que, por força de tortura, precisar um horário, diria que foi às oito e meia. Me instalei e fui logo comprar algo para cozinhar. Comi como alguém que não comia há uma semana, conversei com dois camaradas de La Plata e fui dormir leve como uma cortina de fumaça. Sexta-feira, vinte e um de novembro do corrente ano. Acordei cedo para cruzar a fronteira. De onde eu estava hospedado, dez minutos caminhando e já me encontraria na divisa entre Argentina e Bolívia. Do lado argentino, uma pequena fila. Paguei a multa de cinquenta pesos devido ao visto vencido. Tudo resolvido. Em Villazón, lado boliviano, formulário preenchido, passaporte carimbado. "Tem que ser selado, registrado, carimbado, avaliado, rotulado, se quiser voar". Me falaram que pode-se comprar celulares, câmeras e filmadoras digitais, tênis e até uma alma. Otimos preços! Eu não quis nem saber, estive o tempo de esperar o ônibus que me deixaria em Tupiza. Tampouco tenho dinheiro comprar essas parafernálias. Três horas de viagem em estrada de terra. Quatro lindos bebês se organizaram e fizeram um coro de choro, com direito a solos de fazer inveja a qualquer tenor. O concerto durou pouco. Cheguei em Tupiza, cidade tranquila, pequena. Consegui um bom e barato lugar. Cozinhei. Saí para dar uma volta e, por pura casualidade, encontrei os dois camaradas de La Plata. Jogamos conversa fora, tomamos duas cervejas. Voltei para casa, li um pouco o livro Los Lanzallamas, do impressionante escritor argentino Roberto Arlt, e dormi. Dia seguinte, ônibus para Uyuni às dez da manhã. Seis horas de estrada. De terra. As serras bolivianas davam o contorno à minha paisagem. Serras onde em outubro de 67 capturaram e fuzilaram Ernesto Guevara de la Serna. Naquele nove de outubro, o general do Exército Boliviano e futuro presidente ditador, René Barrientos, fortemente apoiado econômica e militarmente pelos Estados Unidos, deu ordem para assassinar Che. Desgraçadamente, há quem bata palma para Barrientos e os yankees. Cheguei em Uyuni às quatro da tarde e, como rotina, saí a buscar onde poder dormir. Me instalei e fui comer alguma coisa, ver o movimento da cidade. À noite, chequei notícias, e-mails... Bati um papo com meu amigo Gustavo e fui dormir, depois de ler algumas infelizes páginas, como um bebê inocente, que nem desconfia da hostilidade que habita o nosso mundo. No dia seguinte, domingo vinte e três de novembro, céu de anil, fui conhecer o Salar de Uyuni, o famoso deserto de sal. Um passeio com guia, almoço e uma paisagem que não acaba mais. São doze mil metros quadrados de deserto. Incrível! Nem vou me atrever a escrever algo sobre esse lugar. Será pouco. Fim de passeio, hora de pegar o ônibus, às oito da noite. Destino: Potosí. Às duas da madrugada, cansado depois de seis horas de viagem - sim, em estrada de terra, cheguei em Potosí, cidade a 4.060m acima do nível do mar. A altitude incomoda bastante. Tá na hora de mascar folha de coca! Eu tive asma quando pequeno, assim como Che. A minha era mais amena que a dele. Busquei qualquer lugar, desses baratos, só para cair em sono profundo. Acordei nesta segunda-feira decretando feriado e procurando um outro lugar para "morar". Encontrei um legal e com bom preço, com bastante gente para conversar e trocar idéias. Gostei da cozinha. Saí para comprar alguns ingredientes para meu macarrão. De barriga cheia, fui caminhar pelo centro. Subir, ofegante, as ruas de Potosí. Quando eu subia e me faltava o ar nosso de cada dia, eu pensava no cigarro, mas depois me lembrava da altitude e ficava bem aliviado. Fumantes são mestres em arrumar desculpas. No mirante, brinquei com seis crianças de jogar avião de papel. Agora, no café deste mesmo mirante, tendo o pôr-do-sol como confidente, tomo meu chocolate com leite. Fumo um cigarro com muito prazer e escrevo estas linhas, ainda com dúvidas se amanhã vou para La Paz.
Potosí - Bolivia
24/11/08
* Por fim, fui para La Paz na terça, vinte e cinco de novembro. Antes, com uma argentina, Paula, e Uli, um companheiro alemão que esteve uns dias em BH e achou a cidade insegura e violenta, fui conhecer, nas redondezas de Potosí, o lago Ojo del Inca. Voltamos e cozinhamos uma bela comida juntos. à noite, pus todos os meus personagens de/em acordo e, assim, pude viajar sossegado.

viernes, 28 de noviembre de 2008

Em casa...

Depois de estar um dia e meio na bela Humahuaca, província de Jujuy, peguei o ônibus que me largou, após três horas, em Iruya, cidade que não chega a ter mil e quinhentos habitantes, na província de Salta, a 2.764m acima do nível do mar. Foi só eu descer do ônibus, numa quarta-feira às nove da noite, veio um garoto com a euforia de dezesseis anos me oferecer um quarto para passar a noite. (A pacata cidade é invadida pelos turistas no carnaval. Nessa época, aqui não é lugar para descansar, me disse o camarada. Bebe-se muito, muita festa. "La alegria no es solo brasilera" (Charly García)). Subimos uma pequena e estreita rua. Ofegantes. Chegamos à casa de Dona Asunta e Seu Ricardo. Asunta está viajando, infelizmente não pude conhecê-la. Seu Ricardo é de uma tranquilidade contagiante. O homem, que deve ter uns 90 quilos de serenidade, estava acompanhado de seu sobrinho, Angel. Tudo era muito simples. Tudo estava em ótimas condições. Quem disse que eu preciso de luxo? Como se fôssemos da mesma família, nos sentamos à mesa. Comi arroz, duas empanadas, tomate e alface. Eles já haviam comido. Sabe como é, né? No campo, às sete da noite o jantar já está pronto. Assistimos um pouco de televisão, conversamos sobre futebol e outro tanto sobre Brasil e Argentina. Um pôster do River Plate decorava a parede envelhecida sorrateiramente pelo tempo. Saímos para ver as estrelas no pátio. Lhes dei boa noite, depois de estarmos os poucos minutos necessários para fumarmos um cigarro. Fazia frio... Com o barulho da chuva fina e cuidadosa que caía no telhado de amianto, fechei os olhos e, sem que eu percebesse, adormeci em um colorido sonho. Despertei às dez da manhã de uma quinta-feira de algodão, vinte de novembro, com cheiro daquele mesmo vigésimo dia de novembro que vivi em 68, para uma última volta pela cidade. Iruya é tão pequena e mágica que se pode escutar pelo alto-falante: Senhor Javier, favor comparecer à Prefeitura às 16h". Depois da caminhada, comprei quatro bifes para almoçar com Seu Ricardo. Ele comeu apenas um. Cuidados com a saúde, recomendação médica, explicou-me. Angel não estava. Almoçamos, conversamos um pouco e, às duas da tarde, peguei o ônibus de volta à Humahuaca e deixei Iruya para trás. Agora a levo no bolso da minha jaqueta azul, no lado do coração.
Iruya - Província de Salta
20/11/08

lunes, 24 de noviembre de 2008

Eu e Fabián: bate-papo em Tilcara

Após deixar Purmamarca e viajar pouco menos de uma hora, cheguei em Tilcara (2461m acima do nível do mar), norte da província de Jujuy, às duas da tarde. Terça-feira um pouco nublada. Caminhada pela cidade para ver os que habitam o local. Eu não estarei muito em Tilcara, pois às nove da noite pegarei o ônibus rumo à Humahuaca. Fui a um armazém pedir para usar o banheiro. Comprei duas empanadas e me sentei no passeio para ver a banda passar. Aí estava Fabián. Fabián é um garoto de oito anos. Sorriso envergonhado, tímido. Gosta muito de jogar futebol com os amigos da escola, mas quer mesmo ser policial. É torcedor do River Plate, assim como seu pai. Fabián adora ver televisão e jogar vídeo-game. Porque é jogo de criança, me explicou. Ele é o mais novo de um total de oito irmãos. E onde está sua esposa? Não tenho esposa, lhe comentei. Onde está sua namorada, perguntei. Não tenho, me respondeu encolhendo os ombros e sorrindo com pureza e leve vergonha. Fabián não gosta, de jeito nenhum, de cachorros. Podem morder e me machucar, me disse. Fazia frio, ventava bastante. Depois de muito conversarmos, nos despedimos e ele foi, como me havia dito, ajudar a séria senhora dona do armazém. Aqui na rodoviária, encontrei Matías (esse mesmo, o de Cafayate e Salta) por pura coincidência. Conversamos um pouco, fumamos um cigarro. Matías está regressando à casa; eu, no ônibus das nove, chegarei em Humahuaca, a 42km de Tilcara, onde conheci meu amigo Fabián.


Na rodoviária...
18/11/08

viernes, 21 de noviembre de 2008

Estrada e vida que segue (como tem que ser)

Cafayate é uma encantadora cidade. Pequenininha, tranquila, dessas que dá vontade de carregar na palma da mão. Após pouco caminhar, encontrei um hostel. E ali fiquei. Bom preço, ambiente buena onda. Seis da tarde. Deixei a mochila na cama e fui logo tomar um banho. Mais relaxado, pude ter contato com os outros viajantes do lugar. Me sentei a tomar mate e conversar com quatro pessoas que seriam meus companheiros de viagem pelos próximos dois dias. Os argentinos Matías e Paola, a francesa Lídia e o dinamarques Tobien. Após duas horas de conversa, mate e alguns cigarros, fui cozinhar. Minha cabeça reclamava, angustiada, e doía. Além de haver caminhado muito tendo o sol forte como pele, não havia comido bem e tomei pouca água. Era natural que minha cabeça desse sinais de descontentamento. Comi, mas continuava doendo. Mesmo bem alimentado, sentia alfinetadas, precisas e intensas, em minhas têmporas. Eles (os quatro) saíram para tomar uma cerveja à meia-noite, eu fui para o berço, como se diz. Se eu não fosse dormir em cinco minutos, minha cabeça explodiria como a rosa de Hiroshima. No dia seguinte, um quatorze de novembro, sexta de lindo sol, acordei para o café da manhã, que é servido até às dez. Um pouco mais de conversa com los chicos, que se foram para Salta (capital) no ônibus das duas. Como eu iria mais tarde, combinamos que eles me avisariam em qual hostel estariam e eu marcharia pra lá. No mesmo horário que eles se foram, fui fazer um passeio pela Quebrada de Cafayate, La Garganta del Diablo e El Anfiteatro, lugares lindos de formações rochosas impressionantes. Pela Quebrada um vento que só vendo! Se eu soltasse meu corpo, era capaz de o vento levar-me até a Lua. Não seria má idéia, confesso. O último lugar a conhecer, El Anfiteatro, também era o local onde passaria o ônibus que me levaria à Salta, às sete. Cinquenta minutos antes eu já estava na beira da estrada. "Foi lá na beira do Pantanal, seu corpo tão belo enterrei". E o quê eu iria fazer? Pedir carona. Passaram um, dois, dez carros... e nada. Comi duas empanadas que tinha guardadas em minha mochila. Fumei um cigarro. Vi um enorme caminhão. Pode ser esse, pensei, com um fio de esperança. Não foi desta vez. Poucos minutos depois, mais um carro, mais um sinal de dedo. Só que desta vez funcionou. Pararam a alguns metros à minha frente, corri, lhes cumprimentei e perguntei para onde estavam indo. Salta, capital. Bingo! É o meu destino também, posso ir com vocês? Após dois segundos de dúvida, me disseram de forma simpática que sim. Coloquei a mochila no porta-malas, entrei no confortável carro, desses bem modernos, com velocímetro digital e um bocado de botõezinhos no volante, cada qual com sua função, uma mais moderna que a outra, imagino. Quem tomava o melhor cafezinho de Formiga no Rex do Seu Milton nem podia imaginar que um dia existiria carros tão modernos assim, que só faltam falar. Mas só o Fusca pode e sabe falar, eu sei disso. Pois bem... foram duas horas de agradável viagem com Jorge e Linda. Eles são de Córdoba. Suponho que Jorge tem seus quarenta e oito anos e Linda, quarenta e cinco. Têm três filhos, me mostraram a foto. Jorge é engenheiro e vai muito a trabalho para o Brasil. Certa feita, em Belo Horizonte trabalhou um mês. Gostou muito da cidade jardim, que já nao é tão jardim mais. Linda é filósofa. São pessoas, como se diz, da melhor qualidade. O hotel onde se hospedariam por duas noites fica no centro. Descemos do carro, nos despedimos com sorrisos e abraços de velhos conhecidos e caminhei oito quarteirões até o hostel onde eu me encontraria com los chicos. Nove da noite de uma sexta-feira movimentada em Salta, que deve ter seus trezentos mil habitantes. Cheguei ao hostel, tomei banho, comi e me encontrei com os outros quatro viajantes. Fomos à um bar perto do albergue tomar algumas cervejas. Foi uma noite muito divertida. Sábado pela manhã acordamos e nos encontramos (tínhamos que sair às 11h). Breve caminhada até a rodoviária. De mala e cuia. Matías, Paola e Lídia seguiriam viagem. Tobien e eu ficaríamos e buscaríamos outro hostel. E assim fizemos. Conseguimos um lugar bom e barato. Deixamos as mochilas e fomos comer algo. Tirei um breve e necessário cochilo e, com Tobien, fui visitar sua amiga que trabalha em outro hostel. Três cervejas, um pouco de prosa e fim de papo. Assim foi minha tranquila e última noite em Salta. Domingo de sol, Tobien e eu fomos para San Lorenzo, pequena cidade a quarenta e cinco minutos da capital. No trajeto, um garoto, que deve ter treze ou quatorze anos e outro com seus vinte e cinco, se beijaram. Duas vezes. Tobien não gostou muito de ver. Chegamos no parque, subimos a serra para ver a cidade lá de cima. Subida difícil, escorregadia. Muitas pedras e terra fôfa. Lá do alto tiramos foto, descansamos e conversamos um bom instante. A descida é mais tranquila. Pode-se, e é mais fácil, descer de lado, deslizando por vezes. Voltamos à capital, compramos e cozinhamos belos e suculentos bifes com batatas. E pão. Tínhamos fome. Tudo isso com direito a uma Quilmes vermelha bem gelada. E nos despedimos. Eu teria que pegar o último ônibus daquele proveitoso domingo, dezesseis de novembro. Deixei Salta La Linda às dez, rumo à San Salvador de Jujuy, capital da província de Jujuy. Mesmo esquema rotineiro: buscar hostel para descansar e ter uma tranquila noite de sono. E sonhos. Encontrei com facilidade. Dormi como um tijolo. Me despertei, comi e dei uma volta pela cidade. Não há muito o que fazer na capital de Jujuy. Melhor mesmo são os pueblitos, as cidadezinhas. Aliás, de Tucumán e Salta também. Encontrei, como havíamos combinado, com Ramiro e Valéria, dois amigos de Buenos Aires que também estavam por essas bandas. Duas horas depois eu já estava na rodoviária, depois de fazer um belo lanche, para pegar o ônibus à Purmamarca, um lindo pueblo de não mais de cinco mil habitantes. Pisei no chão de terra de Purmamarca, onde as nuvens parecem tão perto que quis tocá-las, às dez e meia e me instalei em um simples e cômodo alojamento. Comi meus pãezinhos, caminhei pela cidade, que deve ter uns quinze quarteirões, rodeados e protegidos por serras e montanhas. Depois de estar na praça e ver o céu e as estrelas jujeñas, fui dormir. Acordei hoje, dezoito de novembro, às sete e meia para, com três outros camaradas, dar uma volta e conhecer o Cerro de los siete colores e La Montaña Colorada. Belo passeio! Dos três, um era argentino, um norte-americano e Rosane, uma francesa de pele vermelha castigada pelo sol. Nos despedimos e agora estou na praça, onde ontem vi uma estrela que se chama Renê, escrevendo e esperando o ônibus que, daqui a pouco, me deixará em Tilcara, outro pueblo do norte da província de Jujuy. Cada vez mais me acerco à fronteira com Bolívia. Falta pouco para conhecer outro mundo...
* Por todo o norte argentino, muitos turistas, mesmo não estando em temporada alta. Impressionante a quantidade de franceses.
Deixando Purmamarca...
18/11/08

lunes, 17 de noviembre de 2008

Como eu havia dito, é só o início, meu camarada...

Depois de uma volta durante todo o dia por San Miguel de Tucumán, sentei para tomar uma cerveja, comer três empanadas e olhar uns mapas que tenho... e isso até me fez parecer um mochileiro organizado. Comi as famosas empanadas tucumanas e fui para o hostel dormir. Me despertei às oito da manhã daquela quarta-feira, doze de novembro, tomei café e fui para a rodoviária comprar passagem e seguir estrada rumo à Tafí del Valle, ainda na província de Tucumán. Pouco mais de três horas de viagem. Paisagens que me transmitíam um poder imenso. Tafí é um lindo pueblito. Comparando-a ao Mineirão, a pequena e simpática cidadezinha, onde eu tinha vontade de cumprimentar a todos, e de fato assim fazia, seria o gramado e as imponentes montanhas seriam as arquibancadas deste estádio onde já chorei de raiva e de alegria. Tirei muitas fotos, caminhei bastante. Lá pelas dez da noite, cozinhei e fui tomar uma única e exclusiva cerveja com um camarada suíço que eu havia conhecido. Voltamos para o hostel meia-noite, li um pouco e dormi feito uma rocha. Acordei cedo pois ia para Amaicha del Valle no primeiro ônibus do dia seguinte, aquela silenciosa quinta-feira. Acordar às sete e meia não foi tão complicado. Comprei um par de facturas e fui para a rodoviária. Algo me disse, talvez um vento intrometido, que eu não deveria passar por Amaicha, que deveria seguir diretamente para Las Ruínas de Quilmes. Que bom que eu dei ouvidos a esse sábio vento! Comprei passagem para Las Ruínas. Antes de chegar ao meu destino, paramos numa blitz da polícia. Subiram com cachorros. Cachorros farejadores, desses bem fuxiqueiros, que querem encontrar tudo só para massagear seu ego de cachorro vaidoso. Dois espanhóis e dois baianos tiveram que descer para prestar algumas informações e deixar que revistassem suas bagagens. Eu também. Me pediram documento, lhes mostrei a cédula de identidade. O policial retrucou e quis ver o papel de entrada no país, que no meu caso é o carimbo no passaporte, documento esse que eu não queria mostrar. Não tive escolha. Ah, me disse, então quer dizer que voce está com o visto vencido há um mês e meio? Sim, verdade, mas quando cruze a fronteira com Bolívia, pagarei uma multa e terei o visto renovado por mais três meses, lhe expliquei com certa autoridade. Faça isso em Salta, em um departamento de imigração. Claro, farei quando pise em Salta, lhe respondi. Nem me preocupei com isso. Tudo se resolverá na fronteira com Bolívia. Abriram mochila, revisaram tudo. Havia muito pó branco esparramado dentro da mochila. O policial provou com excitante curiosidade. Era sal que eu uso para cozinhar que havia caído por todo lado. Seguimos viagem sem nenhum cheiro de problema. Desci num certo ponto da estrada, a atravessei com passos precisos e fui ao encontro de um homem não muito alto e que deve ter seus quarenta e cinco anos. Se chama Hernan e estava aí para levar as pessoas até a entrada das ruínas, num caminho de terra de cinco quilômetros. Muito simpático o camarada, me deixou na entrada, onde também deixei minha mochila e fui ver as ruínas, que foram locais de resistencia indígena à colonizacao espanhola. Andei muito, tirei muitas fotos. Fiquei impressionado com tanta beleza. Cheguei até a metade da ruína onde se pode subir, o que já é considerável. De um lugar bem alto, me sentei, tirei a camisa. Me sentia extremamente bem. Todos embaixo estavam pequenininhos. Desci com imensa satisfação de poder ter pisado nessas pedras que guardam segredos. Não havia muita gente, apenas os que trabalham ali no local, e um casal que estava indo embora. De carro. Não pensei duas vezes e pedi uma carona. Caminhar esses cinco quilômetros de volta à estrada não estava nos meus planos. Claro, pode entrar, disseram os holandeses. Maravilha! Papo vai, papo vem, arranhando meu inglês pra lá de razoável, me esqueci da mochila na entrada. Quando me lembrei, já estava descendo do carro e agradecendo ao amável casal. Não me restava outra, teria que caminhar e resgatar minha mochila. Quem sabe não chega algum turista de carro, me indaguei. Resolvi fumar um cigarro. Não havia ninguém. Só escutava o canto dos pássaros. Um deles cantava Beatles. Sim, é verdade que os pássaros gostam muito de Beatles. Foi quando eu escutei: "Ei, brasileiro...". Era Hernan, o simpático camarada que faz o "frete" com sua caminhonete ano 72. Lhe expliquei e ele me disse que me levaria até lá. Sempre com boa conversa. Para agradecer-lhe, o convidei para tomar uma cerveja e uma porção de batatas num bar na beira da estrada, que na verdade era a casa daquela terna senhora. Estivemos aí quase uma hora, em companhia de dois senhores, que eram irmãos e moravam nas redondezas. Muita prosa, casos. Tirei fotos. Foto, também, do sossegado cavalo branco de um dos irmãos. O dono tinha muito orgulho do animal e amigo, chamado El Cholo. Me despedi e fui para a estrada seguir meu caminho a Cafayate, província de Salta, a uma hora e meia desse lugar onde estive com gente de verdade. Pedi carona na beira da estrada. Sim, ainda se pode viajar de carona pelo norte argentino. Gosto muito dessa idéia. Viajar a dedo! Quarenta minutos, ninguém parou, mas eu sabia que o ônibus passaria por alí. E não falhou. Dei sinal, o ônibus parou e pude, com extrema tranquilidade, chegar a Cafayate para seguir o mesmo roteiro: rodoviária, posto de informaçoes turísticas e buscar uma cama para descansar meu corpo delgado, feliz em percorrer cada centímetro desta viagem.


* Hoje continuo a escrever o que me aconteceu até ontem à noite, domingo, quando aqui cheguei. Tenho sonhado muito. Pessoas que viveram e vivem em minha vida sempre me visitam. "Some are dead and some are living, in my life i've loved them all."

San Salvador de Jujuy (capital da Província de Jujuy) - Argentina
17/11/2008

martes, 11 de noviembre de 2008

É só o início, companheiro Bruno...

(Ainda em Buenos Aires, dia 10/11...) Saímos com vinte minutos de atraso. Exatamente às onze da manhã o trem começou a percorrer os primeiros quilômetros rumo a Tucumán. Buenos Aires vai ficando pra trás, cada vez mais, bem lá no fundo. Tenho uma poltrona ao meu lado e duas à minha frente, parecido com alguns ônibus de Belo Horizonte, quando ou você olha para a rua, para o chão ou para a pessoa que está à sua frente. Nunca gostei de sentar-me nessas condições. No meu caso, as três pessoas são, suponho, da mesma família. Por vezes se acercam para cochichar algo que, parece, não lhes é conveniente que eu escute. Só olho de rabo-de-olho. Parecem gente humilde. "Tem certos dias em que eu penso em minha gente e sinto assim todo o meu peito se apertar". Eles são de Santiago del Estero, província do norte argentino, perguntei para um deles. O mais velho lembra meu avô. Pele cor de picolé de côco queimado, pele de gente do campo, assim como tinha Seu Jair.
Quase não dormi na noite passada. Músicas de Bob Dylan tocaram sem parar no rádio que eu tenho na minha cabeça, por isso não preciso usar iPod, mp4 e todas essas parafernalhas. Tiro um breve cochilo. De boca aberta. Passagens, por favor! Me desperto com o grito do funcionário. Tenho um pouco de fome e como a metade do meu sanduíche de milanesa. Começo a espirrar sem parar e meu nariz a escorrer, o que muito me incomoda e irrita. Da janela bastante empoeirada vejo tudo ficando para trás. Pequenas casas de campo, pasto, algumas simpáticas vacas. Baixem a persiana, por favor, diz o funcionário da Ferrocentral. Uma breve pausa em Villa Constituición. Saludos a Nazareno! Próxima parada: Rosário, cidade onde nasceu meu amigo Che. Poderei descer e fumar um cigarro. O vagão está lotado. Muitas famílias. Crianças tomam refrigerante e fazem trilhões de perguntas aos seus respectivos pais. Poucas sabem responder os adultos. Somos tão tolos! Legal mesmo é ser criança. Cansei de escrever com o chacoalhar do trem. Vou fechar os olhos e, quem sabe, cair em sono lindo e profundo. Hey, Dylan, toque uma canção para mim...

* Depois de 25 horas de cansativa viagem, cheguei a Tucumán, mais precisamente à capital, San Miguel de Tucumán, ao meio-dia. Cabelo sujo, pele melosa. Uma ducha de trinta minutos, uma sessão de massagem de uma hora com suco bem gelado de abacaxi e hortelã, pode ser? Pedi fogo à uma garota, começamos a conversar. Ela, que é de Buenos Aires, contou-me que seu destino é Cuba. Dividimos o táxi até o centro, nos despedimos e desejei-lhe sorte na viagem. No centro, procurei um hostel e me instalei. Fico aqui uma noite, amanhã sigo para Tafí del Valle, aqui pertinho. Tá um calor infernal! Vou dar uma volta pela praça, a noite está linda. Hoje é aniversário de minha irmã. Parabéns, Maíra !!! Felicidade, paz e amor hoje e sempre!! Sinta-se abraçada e beijada daqui de longe...


San Miguel de Tucumán (capital da Província de Tucumán) - Argentina
11/11/2008

lunes, 3 de noviembre de 2008

...o dia já vem raiando, meu bem, e eu tenho que ir embora...

Após um ano e um mês morando nesta residência estudantil, chegou a hora de arrumar as coisas e zarpar. Hoje é minha última noite aqui. Amanhã vou para a casa de dois amigos, "moro" com eles até dia 10, quando começo minha viagem ao estilo Kerouac, como um verdadeiro vagabundo iluminado. Tá chegando a hora...

miércoles, 29 de octubre de 2008

Você já foi ao espelho, nêgo? Não?! Então vá!

Estive toda a tarde, beijado pelo sol portenho, no terraço de minha casa escutando música e pensando. Na vida, em qualquer coisa. Me lembrei das boas his(es)tórias que vivi com meus amigos e até de quando, em uma festa de fim de ano na minha escola, eu cantei, com meu companheiro Danilo, "Tente Outra Vez", de Raul. Eu tinha oito anos e esse baiano já começava a fazer uma tremenda revolução na minha cabeça.
Pois bem... Eu estava verdadeiramente tranquilo; me sentia tão bem que o estridente ruído do freio do ônibus nem chegava a me incomodar. De repente, como num estalar de dedos, meu olhar se perdeu longe naquele horizonte confuso e desconhecido. Da plenitude e paz sentidas até então, passei a experimentar uma sensação amarga, dolorosa, como se alguém tivesse jogado sete toneladas de culpa em meus ombros. Me senti monstruosamente pesado, julgado, marginalizado e condenado sem direito à defesa. E, de fato, quando me levantei da desalmada cadeira de plástico que sustentava toda minha angústia, quase caí, tal qual um bêbado, no chão verde-cinza. Me reergui, bem verdade com dificuldade, e tratei logo de encontrar uma solução para tirar esse horrível e injusto peso que, confesso, me produzia certo incômodo. Cinicamente, tentei chorar. Não consegui. Nesse inútil desespero, me lembrei que eu tinha algo mais importante a fazer que ajoelhar-me e deixar que essa carga me fizesse desabar feito um troço morto de carne. Ora, eu tinha que cozinhar e, depois, ir ao cinema! Me senti pleno novamente, pude respirar sem dor, limpo.
E foi assim, com admirável displicência, que tirei, como se fosse uma ridícula pena da mais vaidosa galinha, essas sete toneladas que quiseram colocar, sutilmente, sobre meus lindos e inocentes ombros.
Buenos Aires
22/09/2008
Primavera nos dentes...

miércoles, 22 de octubre de 2008

Chão de estrelas

A música que toca me faz tão bem que posso voar. Voar, dançar no céu, brincar nas nuvens. Quero escutar jazz no céu, voando ao som de uma melodia que me faz querer gargalhar e rodar os braços de louca alegria. De notas musicais quero fazer minha vida. Livre, plainando com asas fantasmagoricamente leves e surreais. De repente, me dou conta que estou voando sem sair do meu quarto, da cadeira negra, enquanto um triste cigarro se apaga docemente no cinzeiro de madeira. É uma sensaçao linda! Posso me levantar da cadeira e abrir a geladeira; mesmo que o faça, seguirei voando, longe. Quão longe não poderia precisar, mas é distante o suficiente para saber que é lá onde quero estar, num lugar onde ninguém é pássaro mas todos podem voar.

Buenos Aires
18/06/08
Algumas fotos que tirei, há poucos dias, com a câmera analógica que o Toninho do Rex me emprestou. Vou postando, aos poucos, algumas que tenho em um cd. Admirável Mundo Novo!

lunes, 20 de octubre de 2008

Como uma rocha

Ontem fechei os olhos e, na imensa escuridão do meu pensamento, vi, pouco nítido, um sujeito de barba muito parecido a mim. Fiquei curioso e consegui desvendar a tal criatura. Era eu, com minha cara idiota e debochada, num espelho infinito e revelador. Abri os olhos contente e aliviado. O que eu há muito desconfiava se fez certeza: eu tô vivo !
Buenos Aires
setembro/2008

domingo, 19 de octubre de 2008

Tudo azul...


Domingo de sol em Buenos Aires. Dia de clássico entre Boca e River. Dia de clássico, também, em Belo Horizonte. Os dois maiores de Minas se enfrentaram pela quinta vez em 2008, ano do centenário atleticano. Por aqui, deu Boca, 1 a 0. Na Pampulha, deu Cruzeiro, 2 a 0. É, meus caros companheiros, parece que hoje não foi um bom dia para las gallinas...

miércoles, 15 de octubre de 2008

Dale Booo...

Eu, meu amigo Fernando (de camisa do Boca) e três camaradas israelenses. Foi nesse dia que eu vi aquela camisa, meus caros...

Más allá de todo eso...

Vamos a formar una Tierra propia, donde el gran milagro no será caminar en las nubes o en el agua pero sí caminar en la tierra. Quiero mirar hacia arriba y ver un cielo de diamantes y barriletes amarillos colgados.
Quiero formar una Tierra propia. Yo estoy listo, ¿y vos?

Buenos Aires
13/09/08

lunes, 6 de octubre de 2008

Agora eu acredito! (Baseado em alguns fatos reais)

Completei um ano morando em Buenos Aires no último dia 04. Tomei cerveja e escutei música com amigos, um bom motivo para reunir um pouco de gente. Ontem, domingo de sol, dia lindo. Para presentear o Bruno que gosta de futebol, decidi ir ao jogo do Boca. La Bombonera seria perfeito, sobretudo porque não trabalho mais aos domingos à tarde e o adversário era o Estudiantes, um bom time de La Plata, capital da Província de Buenos Aires. Combinei com Fernando, um amigo, de irmos ao estádio comprar os ingressos. Eu tinha que comprar o meu e de mais cinco camaradas de Israel que estão "parando" aqui no hostel. Compramos os sete ingresos com grande tranquilidade e voltamos pra casa. Almocei uma deliciosa carne ao forno com batatas e fui encontrar os israelenses para, em seguida, irmos à minha casa pegar as entradas e assim, de ônibus, tomarmos rumo ao estádio. Tudo correu com perfeita harmonia, entramos na charmosa Bombonera. Na arquibancada, ficamos em um lugar razoavelmente bem localizado. Tínhamos ingressos para o setor atrás do gol, a chamada popular. Como já estava quase lotada, não deu para escolher melhor posição. O estádio estava cheio. Me acomodei e fumei um cigarro. Comprei um picolé. Calor danado! Foi justamente nesse ínterim que eu vi. Eu vi, a uns sete metros, uma camisa listrada em preto e branco com um numero 10 em vermelho nas costas. O rapaz que a usava veio torcer pelo Boca, deduzi pelo seu boné. Claro! Foi aí que me lembrei de um time de futebol lá da minha cidade. Clube importante, centenário. Mas alguma coisa naquela camisa me transmitia derrota. Sim, óbvio! Eu me lembrei dos meus tempos de criança, quando meu pai escutava um vinil de Lennon de um show no Madison Square Garden. Foi nesse tempo que eu me acostumei a ver um monte de camisa igual à que eu vi hoje. E com o passar dos anos me acostumei, também, a ver um outro tanto de derrotas deste clube. O deliciosamente curioso é que quando eu vi esta camisa eu soube que o Boca ia perder. Sei lá, a coisa, pelo que estou sabendo, tá feia pro lado alvinegro e nem é bom deixar que usem esta camisa em outra torcida. Energia. Por vezes eu acredito nessas coisas.
(Pausa. Enquanto escrevo, um canadense vem conversar comigo e me diz que ontem um pombo cagou em sua cabeça, minutos depois que roubaram sua câmera digital, dessas bem caras. Bem-humorado, me conta que, hoje, outro (ou pode perfeitamente ser o mesmo, vai saber!) pombo o presenteou, bem na careca. E saiu rindo, falando que vai pedir para alguém impedir que haja pombos no céu amanhã.)
Fiquei sabendo que outro dia um camarada entrou no estádio para ver um jogo da primeira divisão do Campeonato Vietnamita de Futebol com esta camisa que eu me acostumei a ver quando criança, mas a torcida do time "da casa" o expulsou da arquibancada. Mas tudo sem violência, claro. Os vietnamitas são muito supersticiosos e sabem que aquela camisa pode trazer má sorte e, fatalmente, uma derrota. Perdi de vista o jovem que a vestia nas arquibancadas do estádio em La Boca. Devem ter pedido, com muita educação e bom senso, que ele se retirasse. Sim, porque eu vi um grupo de boquenses indicando por onde ele devia ir. Fiquei até mais aliviado! Obviamente eu não queria uma derrota dos Xeneizes. Mas o que eu não queria aconteceu. O Estudiantes ganhou a partida. De virada. Mas tudo bem, é sempre bom ver o Boca jogar na sua cancha. Fim de jogo. Sentei, acendi um cigarro e mirei fixo o gramado onde Dom Diego deixou marcas de sua genialidade. Que bobagem isso de falar que se há alguém com esta camisa torcendo por um time, este time perde, pensei, rindo da minha ingenuidade. Uma camisa não pode ser tão poderosa assim!! Além do mais, pediram para que o moço se retirasse. O time de Riquelme perdeu porque tinha que perder e acabou, fim de papo.
Alguém cutucou meu ombro direito, virei para ver. Era um rapaz de boné azul do Boca me perguntando, por mímica, se eu tinha isqueiro. E então, de muito perto, me deparei com a camisa de listras verticais em branco e negro, aquela de um time de futebol lá da minha cidade...
Buenos Aires
06/10/08

viernes, 3 de octubre de 2008

Belos Aires, Buenos Horizontes...

Es cierto que estuve un poco enojado con vos. Pero hoy, por la mañana, estabas especial, con un clima nostalgico. Me hiciste acordar a las mañanas de mi otro hogar. Hoy, tuve una prueba más de nuestra reciente relación. Ahora te quiero aún más, sos parte de mí. Camino por tus calles con más intimidad, ya te conozco mejor; sé de tus caprichos y misterios. Ya te extraño aunque todavia faltan unos meses para que me vaya. Nuevamente me enamoré de vos. Ojalá nunca pierda este sentimiento. Ojalá podamos vivir enamorados para siempre.
Te amo, mi Buenos Aires querido...


Buenos Aires
03/04/08

martes, 30 de septiembre de 2008

Sentia-se fraco, dirigido
Havia sonhado escuro quando deitou na cama que estava
no meio da rua
Ninguém notou aquele apagar

Sentia-se derrotado, sozinho
Havia lutado em vão quando fecharam-se seus olhos naquela doce e escura manhã
Ninguém notou aquele chorar

Sentia-se oco, vazio
Havia morrido cinza quando roubaram-lhe sua alma naquela esquina lúgubre, fria
Mas ninguém notou aquele usurpar
Que lhe acontecerá amanhã, de novo
Quando ele teimar em acordar.

Buenos Aires
Junho/2008

viernes, 26 de septiembre de 2008

A criação pede passagem...

Este espaço é, em sua maioria, a versão digital de meus manuscritos escondidos num velho caderno. Alguns continuarão guardados; quase todos serão publicados.
Que seja prazeroso para quem leia...