lunes, 17 de noviembre de 2008

Como eu havia dito, é só o início, meu camarada...

Depois de uma volta durante todo o dia por San Miguel de Tucumán, sentei para tomar uma cerveja, comer três empanadas e olhar uns mapas que tenho... e isso até me fez parecer um mochileiro organizado. Comi as famosas empanadas tucumanas e fui para o hostel dormir. Me despertei às oito da manhã daquela quarta-feira, doze de novembro, tomei café e fui para a rodoviária comprar passagem e seguir estrada rumo à Tafí del Valle, ainda na província de Tucumán. Pouco mais de três horas de viagem. Paisagens que me transmitíam um poder imenso. Tafí é um lindo pueblito. Comparando-a ao Mineirão, a pequena e simpática cidadezinha, onde eu tinha vontade de cumprimentar a todos, e de fato assim fazia, seria o gramado e as imponentes montanhas seriam as arquibancadas deste estádio onde já chorei de raiva e de alegria. Tirei muitas fotos, caminhei bastante. Lá pelas dez da noite, cozinhei e fui tomar uma única e exclusiva cerveja com um camarada suíço que eu havia conhecido. Voltamos para o hostel meia-noite, li um pouco e dormi feito uma rocha. Acordei cedo pois ia para Amaicha del Valle no primeiro ônibus do dia seguinte, aquela silenciosa quinta-feira. Acordar às sete e meia não foi tão complicado. Comprei um par de facturas e fui para a rodoviária. Algo me disse, talvez um vento intrometido, que eu não deveria passar por Amaicha, que deveria seguir diretamente para Las Ruínas de Quilmes. Que bom que eu dei ouvidos a esse sábio vento! Comprei passagem para Las Ruínas. Antes de chegar ao meu destino, paramos numa blitz da polícia. Subiram com cachorros. Cachorros farejadores, desses bem fuxiqueiros, que querem encontrar tudo só para massagear seu ego de cachorro vaidoso. Dois espanhóis e dois baianos tiveram que descer para prestar algumas informações e deixar que revistassem suas bagagens. Eu também. Me pediram documento, lhes mostrei a cédula de identidade. O policial retrucou e quis ver o papel de entrada no país, que no meu caso é o carimbo no passaporte, documento esse que eu não queria mostrar. Não tive escolha. Ah, me disse, então quer dizer que voce está com o visto vencido há um mês e meio? Sim, verdade, mas quando cruze a fronteira com Bolívia, pagarei uma multa e terei o visto renovado por mais três meses, lhe expliquei com certa autoridade. Faça isso em Salta, em um departamento de imigração. Claro, farei quando pise em Salta, lhe respondi. Nem me preocupei com isso. Tudo se resolverá na fronteira com Bolívia. Abriram mochila, revisaram tudo. Havia muito pó branco esparramado dentro da mochila. O policial provou com excitante curiosidade. Era sal que eu uso para cozinhar que havia caído por todo lado. Seguimos viagem sem nenhum cheiro de problema. Desci num certo ponto da estrada, a atravessei com passos precisos e fui ao encontro de um homem não muito alto e que deve ter seus quarenta e cinco anos. Se chama Hernan e estava aí para levar as pessoas até a entrada das ruínas, num caminho de terra de cinco quilômetros. Muito simpático o camarada, me deixou na entrada, onde também deixei minha mochila e fui ver as ruínas, que foram locais de resistencia indígena à colonizacao espanhola. Andei muito, tirei muitas fotos. Fiquei impressionado com tanta beleza. Cheguei até a metade da ruína onde se pode subir, o que já é considerável. De um lugar bem alto, me sentei, tirei a camisa. Me sentia extremamente bem. Todos embaixo estavam pequenininhos. Desci com imensa satisfação de poder ter pisado nessas pedras que guardam segredos. Não havia muita gente, apenas os que trabalham ali no local, e um casal que estava indo embora. De carro. Não pensei duas vezes e pedi uma carona. Caminhar esses cinco quilômetros de volta à estrada não estava nos meus planos. Claro, pode entrar, disseram os holandeses. Maravilha! Papo vai, papo vem, arranhando meu inglês pra lá de razoável, me esqueci da mochila na entrada. Quando me lembrei, já estava descendo do carro e agradecendo ao amável casal. Não me restava outra, teria que caminhar e resgatar minha mochila. Quem sabe não chega algum turista de carro, me indaguei. Resolvi fumar um cigarro. Não havia ninguém. Só escutava o canto dos pássaros. Um deles cantava Beatles. Sim, é verdade que os pássaros gostam muito de Beatles. Foi quando eu escutei: "Ei, brasileiro...". Era Hernan, o simpático camarada que faz o "frete" com sua caminhonete ano 72. Lhe expliquei e ele me disse que me levaria até lá. Sempre com boa conversa. Para agradecer-lhe, o convidei para tomar uma cerveja e uma porção de batatas num bar na beira da estrada, que na verdade era a casa daquela terna senhora. Estivemos aí quase uma hora, em companhia de dois senhores, que eram irmãos e moravam nas redondezas. Muita prosa, casos. Tirei fotos. Foto, também, do sossegado cavalo branco de um dos irmãos. O dono tinha muito orgulho do animal e amigo, chamado El Cholo. Me despedi e fui para a estrada seguir meu caminho a Cafayate, província de Salta, a uma hora e meia desse lugar onde estive com gente de verdade. Pedi carona na beira da estrada. Sim, ainda se pode viajar de carona pelo norte argentino. Gosto muito dessa idéia. Viajar a dedo! Quarenta minutos, ninguém parou, mas eu sabia que o ônibus passaria por alí. E não falhou. Dei sinal, o ônibus parou e pude, com extrema tranquilidade, chegar a Cafayate para seguir o mesmo roteiro: rodoviária, posto de informaçoes turísticas e buscar uma cama para descansar meu corpo delgado, feliz em percorrer cada centímetro desta viagem.


* Hoje continuo a escrever o que me aconteceu até ontem à noite, domingo, quando aqui cheguei. Tenho sonhado muito. Pessoas que viveram e vivem em minha vida sempre me visitam. "Some are dead and some are living, in my life i've loved them all."

San Salvador de Jujuy (capital da Província de Jujuy) - Argentina
17/11/2008

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