viernes, 16 de marzo de 2012

Criolo


UM CIDADÃO COMUM

POR Bruno Mateus
FOTOS Bruno Senna

A fala é serena, doce. O olhar, de um verde que salta às retinas, diz muito. As repostas são pausadas, bem pensadas, mas passam longe de serem previsíveis — carregam a sinceridade de quem viu muita injustiça e miséria, mas também enxergou poesia, arte e esperança no horizonte. E expõem, por inteiro, sem disfarces, um artista em busca de abrir o diálogo, de descortinar as contradições de um país como o Brasil e de fazer música por uma necessidade interna. 

Criolo canta por estar desesperado. Talvez, essa dor o acompanhe desde moleque. Junto aos seus quatro irmãos, o rapper sempre morou na periferia da capital paulista. Foi lá que ele teve o primeiro e definitivo encontro com o rap, expressão musical que lhe deu consciência, amor, voz para gritar e, de certa forma, aliviar suas angústias. 

Kleber Cavalcante Gomes já foi Criolo Doido, fundou a Rinha de MC’s, em São Paulo, e tem uma trajetória importante no hip hop. Engana-se quem pensa que só agora é que ele está mostrando a que veio. O sonho de Criolo nunca foi ser jogador de futebol, talvez por ser, como ele confessa, um zero à esquerda dentro das quatro linhas — apesar do amor que sente por esportes. Mas, sobretudo, seu caminho não deu nos gramados porque aquele moleque de 11 anos ficou maravilhado quando descobriu na música uma maneira de se expressar. Dali para frente, nunca mais largaria o rap. Quer dizer, o rap é que não o abandonaria. 

Filho de cearenses, o rapper se emociona ao falar de seus pais, dos tempos em que ia à escola com o uniforme pintado à mão pela mãe, pois não tinham grana para comprar um novo na lojinha, de quando via Seu Cleon sofrer preconceito por ser negro e quando ia ao estádio com ele ver o Corinthians jogar. Com as lembranças, boas ou ruins, fica fácil perceber o orgulho que sente por ter sido criado num ambiente de arte, inspiração e de afirmação da beleza de suas raízes. 

Criolo foi o artista mais comentado de 2011 — o álbum Nó na orelha foi eleito o melhor do ano pela lista da revista Rolling Stone, e Não existe amor em SP, a melhor música. No VMB, premiação da MTV, ele levou para casa os troféus de melhor disco, música do ano e artista revelação. Impossível passar despercebido à sua poesia, que sangra, que chama à luta, que sabe que tem muita coisa errada por aí. E, para Criolo, impossível é cerrar os olhos para tudo isso.

A entrevista continua na edição digital da Ragga de março, pág 70.