viernes, 21 de noviembre de 2008

Estrada e vida que segue (como tem que ser)

Cafayate é uma encantadora cidade. Pequenininha, tranquila, dessas que dá vontade de carregar na palma da mão. Após pouco caminhar, encontrei um hostel. E ali fiquei. Bom preço, ambiente buena onda. Seis da tarde. Deixei a mochila na cama e fui logo tomar um banho. Mais relaxado, pude ter contato com os outros viajantes do lugar. Me sentei a tomar mate e conversar com quatro pessoas que seriam meus companheiros de viagem pelos próximos dois dias. Os argentinos Matías e Paola, a francesa Lídia e o dinamarques Tobien. Após duas horas de conversa, mate e alguns cigarros, fui cozinhar. Minha cabeça reclamava, angustiada, e doía. Além de haver caminhado muito tendo o sol forte como pele, não havia comido bem e tomei pouca água. Era natural que minha cabeça desse sinais de descontentamento. Comi, mas continuava doendo. Mesmo bem alimentado, sentia alfinetadas, precisas e intensas, em minhas têmporas. Eles (os quatro) saíram para tomar uma cerveja à meia-noite, eu fui para o berço, como se diz. Se eu não fosse dormir em cinco minutos, minha cabeça explodiria como a rosa de Hiroshima. No dia seguinte, um quatorze de novembro, sexta de lindo sol, acordei para o café da manhã, que é servido até às dez. Um pouco mais de conversa com los chicos, que se foram para Salta (capital) no ônibus das duas. Como eu iria mais tarde, combinamos que eles me avisariam em qual hostel estariam e eu marcharia pra lá. No mesmo horário que eles se foram, fui fazer um passeio pela Quebrada de Cafayate, La Garganta del Diablo e El Anfiteatro, lugares lindos de formações rochosas impressionantes. Pela Quebrada um vento que só vendo! Se eu soltasse meu corpo, era capaz de o vento levar-me até a Lua. Não seria má idéia, confesso. O último lugar a conhecer, El Anfiteatro, também era o local onde passaria o ônibus que me levaria à Salta, às sete. Cinquenta minutos antes eu já estava na beira da estrada. "Foi lá na beira do Pantanal, seu corpo tão belo enterrei". E o quê eu iria fazer? Pedir carona. Passaram um, dois, dez carros... e nada. Comi duas empanadas que tinha guardadas em minha mochila. Fumei um cigarro. Vi um enorme caminhão. Pode ser esse, pensei, com um fio de esperança. Não foi desta vez. Poucos minutos depois, mais um carro, mais um sinal de dedo. Só que desta vez funcionou. Pararam a alguns metros à minha frente, corri, lhes cumprimentei e perguntei para onde estavam indo. Salta, capital. Bingo! É o meu destino também, posso ir com vocês? Após dois segundos de dúvida, me disseram de forma simpática que sim. Coloquei a mochila no porta-malas, entrei no confortável carro, desses bem modernos, com velocímetro digital e um bocado de botõezinhos no volante, cada qual com sua função, uma mais moderna que a outra, imagino. Quem tomava o melhor cafezinho de Formiga no Rex do Seu Milton nem podia imaginar que um dia existiria carros tão modernos assim, que só faltam falar. Mas só o Fusca pode e sabe falar, eu sei disso. Pois bem... foram duas horas de agradável viagem com Jorge e Linda. Eles são de Córdoba. Suponho que Jorge tem seus quarenta e oito anos e Linda, quarenta e cinco. Têm três filhos, me mostraram a foto. Jorge é engenheiro e vai muito a trabalho para o Brasil. Certa feita, em Belo Horizonte trabalhou um mês. Gostou muito da cidade jardim, que já nao é tão jardim mais. Linda é filósofa. São pessoas, como se diz, da melhor qualidade. O hotel onde se hospedariam por duas noites fica no centro. Descemos do carro, nos despedimos com sorrisos e abraços de velhos conhecidos e caminhei oito quarteirões até o hostel onde eu me encontraria com los chicos. Nove da noite de uma sexta-feira movimentada em Salta, que deve ter seus trezentos mil habitantes. Cheguei ao hostel, tomei banho, comi e me encontrei com os outros quatro viajantes. Fomos à um bar perto do albergue tomar algumas cervejas. Foi uma noite muito divertida. Sábado pela manhã acordamos e nos encontramos (tínhamos que sair às 11h). Breve caminhada até a rodoviária. De mala e cuia. Matías, Paola e Lídia seguiriam viagem. Tobien e eu ficaríamos e buscaríamos outro hostel. E assim fizemos. Conseguimos um lugar bom e barato. Deixamos as mochilas e fomos comer algo. Tirei um breve e necessário cochilo e, com Tobien, fui visitar sua amiga que trabalha em outro hostel. Três cervejas, um pouco de prosa e fim de papo. Assim foi minha tranquila e última noite em Salta. Domingo de sol, Tobien e eu fomos para San Lorenzo, pequena cidade a quarenta e cinco minutos da capital. No trajeto, um garoto, que deve ter treze ou quatorze anos e outro com seus vinte e cinco, se beijaram. Duas vezes. Tobien não gostou muito de ver. Chegamos no parque, subimos a serra para ver a cidade lá de cima. Subida difícil, escorregadia. Muitas pedras e terra fôfa. Lá do alto tiramos foto, descansamos e conversamos um bom instante. A descida é mais tranquila. Pode-se, e é mais fácil, descer de lado, deslizando por vezes. Voltamos à capital, compramos e cozinhamos belos e suculentos bifes com batatas. E pão. Tínhamos fome. Tudo isso com direito a uma Quilmes vermelha bem gelada. E nos despedimos. Eu teria que pegar o último ônibus daquele proveitoso domingo, dezesseis de novembro. Deixei Salta La Linda às dez, rumo à San Salvador de Jujuy, capital da província de Jujuy. Mesmo esquema rotineiro: buscar hostel para descansar e ter uma tranquila noite de sono. E sonhos. Encontrei com facilidade. Dormi como um tijolo. Me despertei, comi e dei uma volta pela cidade. Não há muito o que fazer na capital de Jujuy. Melhor mesmo são os pueblitos, as cidadezinhas. Aliás, de Tucumán e Salta também. Encontrei, como havíamos combinado, com Ramiro e Valéria, dois amigos de Buenos Aires que também estavam por essas bandas. Duas horas depois eu já estava na rodoviária, depois de fazer um belo lanche, para pegar o ônibus à Purmamarca, um lindo pueblo de não mais de cinco mil habitantes. Pisei no chão de terra de Purmamarca, onde as nuvens parecem tão perto que quis tocá-las, às dez e meia e me instalei em um simples e cômodo alojamento. Comi meus pãezinhos, caminhei pela cidade, que deve ter uns quinze quarteirões, rodeados e protegidos por serras e montanhas. Depois de estar na praça e ver o céu e as estrelas jujeñas, fui dormir. Acordei hoje, dezoito de novembro, às sete e meia para, com três outros camaradas, dar uma volta e conhecer o Cerro de los siete colores e La Montaña Colorada. Belo passeio! Dos três, um era argentino, um norte-americano e Rosane, uma francesa de pele vermelha castigada pelo sol. Nos despedimos e agora estou na praça, onde ontem vi uma estrela que se chama Renê, escrevendo e esperando o ônibus que, daqui a pouco, me deixará em Tilcara, outro pueblo do norte da província de Jujuy. Cada vez mais me acerco à fronteira com Bolívia. Falta pouco para conhecer outro mundo...
* Por todo o norte argentino, muitos turistas, mesmo não estando em temporada alta. Impressionante a quantidade de franceses.
Deixando Purmamarca...
18/11/08

3 comentarios:

Gustavo Rodrigues S. Dias dijo...

Fala meu camarada...
De fato, tem sido um belo passeio, certamente uma empreitada para contar para os filhos e netos.

Outro ponto, fico satisfeito em saber que você ainda está com português impecável.

O episódio da carona dá um tom ainda mais aventureiro e lúdico à isso tudo.

Um grande abraço.

Anónimo dijo...

Caro Bruno,

Aproveite bastante a viagem.Continue com os comentários! Papi

Bruno Mateus dijo...

Fico feliz que vocês têm acompanhado minhas andanças... espero que continuem lendo este humilde blog. é motivo de muita alegria para mim.
aquele abraço..
saudades
Bruno.