lunes, 6 de diciembre de 2010

Aquele olhar

Me fascina seu olhar. Me encanta quando ele brilha, ofuscando qualquer sinal de beleza a sua volta. Transborda de seus olhos um sentimento absurdo, incontrolável. Desafia-me, pois bem sei o que neles esconde. De nada adianta recorrer a filósofos, astrólogos ou vagabundos iluminados. Eles não entenderiam. Assim como na vida, para você não há resposta. Eu soube disso naquela manhã quando nos cruzamos torpes pela calçada que ainda sente o peso dos nossos passos descompassados.

Seu olhar mostrou-me o indizível, o que nem Nelson Rodrigues conseguiu decifrar em sua incessante busca pelo desnudamento da alma. Coisa de um tolo apaixonado, seguramente diria um rufião melancólico. Não me importa, realmente. Naquela fração de segundo, vi a eternidade, voei ao som de Nessun Dorma e repousei, sorrindo, atônito, na nuvem ali cuidadosamente pincelada.

E agora, diante da realidade desses dias sem graça, a chuva cai, despretensiosa, borrando da minha memória aquela reveladora manhã.

*Texto de minha autoria originalmente publicado na Revista Ragga, edição de dezembro.